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Falando de Psicologia – (47) – A criança que é alvo de compaixão.

A criança que é alvo de compaixão

 

Muitas pessoas manifestam sentimentos de simpatia e compaixão por uma criança através de expressões como: “coitadinha, é tão pequena ainda”, ou “pobrezinho do meu filho”, ou simplesmente: “coitadinho dele”. Não resta dúvida de que tais palavras são ditas, quase sempre, em tom carinhoso e protetor. Mas, também é certo que podem influenciar negativamente a criança que as recebe.

O sentimento de pena ou compaixão pode surgir em circunstâncias bem diferentes. No entanto, o que caracteriza melhor seu aparecimento, no adulto, é o fato da criança estar enfrentando alguma dificuldade. Exemplos de situações que despertam compaixão:

  • Quando a criança sofre alguma decepção (ser reprovada na escola, por exemplo).
  • Quando a criança adoece ou sofre algum acidente.
  • Quando a criança é portadora de necessidades especiais.
  • Quando a criança não é filha biológica (muitos pais adotivos costumam sentir pena excessiva do filho, como se ele fosse uma criança diferente das outras).
  • Quando a criança passa por alguma experiência de perda (separação dos pais, morte de um ente querido etc.).

Embora o sentimento de compaixão venha acompanhado de carinho e possa até ser visto como expressão de afeto, isso não representa uma ajuda à criança. É que, ao expressar pena excessiva, uma pessoa pode comunicar outros elementos, como por exemplo: falta de confiança, por parte do adulto, na capacidade da criança em suportar decepções ou enfrentar dificuldades; insegurança; medo; desânimo; necessidade de receber apoio constante; imaturidade; sentimento de inferioridade etc.

Como era de se esperar, tudo isso acaba por trazer consequências negativas ao comportamento da criança.

O que pode acontecer, então, quando alguém, (com muita frequência) demonstra ter pena exagerada de uma criança?

  • A criança passa a acreditar que é digna de pena, realmente.
  • Torna-se incapaz de encarar os fatos como são, na realidade.
  • A criança torna-se mais exigente, como se precisasse ser compensada daquilo que sofreu.
  • A criança torna-se cada vez mais vulnerável às frustrações, podendo se esquivar de enfrentar situações novas. Mesmo que se sinta atraída por elas (como é o caso de crianças que se recusam a ir a uma festa, ou a uma competição qualquer).
  • A criança passa a depender dos outros, quando poderia se defender sozinha.
  • A criança passa a se considerar diferente das outras, adquirindo valores e expectativas falsos ou inadequados.
  • A criança torna-se socialmente desajustada, pois sua atenção está inteiramente voltada para si mesma.
  • A criança torna-se passiva e triste.

Tendo em vista a variedade de transtornos que uma compaixão excessiva pode ocasionar à criança, vejamos agora o que vale como recomendação:

  • Em qualquer circunstância, devemos substituir compaixão e atenção excessivas por simpatia e estímulo.
  • Demonstrar pena não significa expressar mais amor. É possível amar uma criança sem revelar que sentimos pena dela, por mais difícil que isso possa nos parecer.
  • Devemos encorajar uma criança a se sentir gratificada quando consegue vencer suas dificuldades.
  • Em caso de doença, podemos satisfazer as necessidades da criança (decorrentes da enfermidade) e ajudá-la a suportar o sofrimento, indicando-lhe alternativas para superar os problemas surgidos.
  • Em síntese, seja qual for o motivo que nos leve a sentir pena de uma criança, é imprescindível dar-lhe apoio, compreensão e carinho, ao mesmo tempo em que estimulamos sua capacidade e autonomia para lidar com situações adversas.

 

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Falando de Psicologia – (46) – A mãe que trabalha fora.

A mãe que trabalha fora

O artigo de hoje traz reflexões sobre a culpa que muitas mães sentem, por terem de deixar o filho na escola, em tempo integral, já que elas precisam desempenhar funções múltiplas, em prol da manutenção da família.

Para esclarecer tal assunto, vou abordá-lo sob três aspectos: o significado do trabalho fora de casa, para a mulher; a importância de uma distribuição adequada do tempo; e a importância da pessoa que substituirá a mãe na sua ausência.

Significados do trabalho fora de casa, para a mulher.

Possibilidades:

  1. O trabalho é uma fonte de prazer, de realização pessoal.
  2. As circunstâncias obrigam a mulher a ganhar dinheiro para o sustento da família.
  3. O trabalho fora pode ser uma fuga (das atividades domésticas ou do contato desgastante com os próprios filhos).

Quando a mulher valoriza seu trabalho, certamente os filhos se sentirão estimulados a fazer o mesmo. Aliás, o efeito positivo pode repercutir até na vida adulta dos filhos, quando chegar a vez destes se dedicarem a uma profissão.

Por outro lado, se a mulher rejeita seu trabalho, ela pode sentir-se sobrecarregada demais, quase uma vítima.

Ou então, a mulher vê no trabalho fora de casa uma forma de passar o maior tempo possível afastada dos afazeres domésticos, com os quais não se identifica. Outras vezes, o contato com os filhos gera conflitos tão intensos, que a mulher acaba se sentindo incapaz de solucioná-los. Trabalhar fora, mesmo sem pressão econômica, pode ser uma válvula de escape para ela.

É nesse contexto que o sentimento de culpa costuma instalar-se. Quase sempre se faz necessário um aconselhamento psicológico, para que a mãe consiga identificar as causas de sua intranquilidade.

Qual a importância da distribuição do tempo, para o trabalho fora de casa e para o lar?

É claro que a realização profissional não deve ser obtida às custas do sacrifício do lar. Ao contrário, o equilíbrio deve partir de uma distribuição adequada do tempo. Assim, a mulher se realiza no campo profissional que escolheu, mas se realiza, também, como mãe e esposa. Reservar um tempo para o lar é, ainda, arcar com a responsabilidade assumida ao trazer os filhos ao mundo.

Mãe, e na sua ausência?

Se os filhos ficam na escola o dia todo, quase sempre existe uma necessidade bem objetiva. E muitas escolas são uma ótima opção, pois oferecem recursos que promovem o desenvolvimento das crianças.

Bem, se a mãe confia na equipe da escola, se aprecia as atividades oferecidas a seus filhos, creio que eles ficarão bem na sua ausência.

Qualquer que seja a formação de quem vai cuidar de uma criança, é fundamental que essa pessoa seja capaz de dar carinho e colocar limites, num ambiente seguro e acolhedor. Isso vale para familiares, professores e babás.

Cabe à mãe, no seu tempo disponível, resgatar todas as possibilidades de expressar amor por seus filhos. Para isso, é bom lembrar aquele velho conceito da psicologia: não importa a quantidade, mas a qualidade do contato.

 

 

 

 

 

 

A figura (por vezes esquecida) do pai.

Quando o assunto é a educação de crianças, a tendência é citar logo a mãe como elemento preponderante e decisivo na formação da personalidade do indivíduo. O pai é muitas vezes mencionado, mas poucos autores enfatizam a relevância do seu papel junto aos filhos. Talvez essa diferença se deva àquele fato tão conhecido de todos – ou seja, pelo menos nos primeiros anos de vida, é da mãe que a criança recebe os cuidados necessários ao seu crescimento e à sua sobrevivência. O pai colabora, mas de maneira indireta (embora existam exceções dignas de elogio).

Não resta dúvida de que a figura do pai, tanto quanto a da mãe, é de suma importância para a formação da personalidade dos filhos. E, para demonstrar inteiramente esse ponto de vista, seria necessário dedicar vários artigos sobre o mesmo tema, isto é, de como o pai pode influenciar no comportamento de cada filho, conforme sua maneira de agir. Mas, é bem possível que, através da discussão de um ângulo apenas, esse ponto de vista seja compreendido. Escolhi, para isso, um aspecto que me parece mais expressivo que os demais – é o sentimento de segurança pessoal que o pai pode transmitir aos filhos.

Mas, o que é um sentimento de segurança pessoal?

Não é fácil definir com exatidão o que significa essa espécie de sentimento, pois se trata de algo bastante subjetivo. Na minha maneira de entender, uma pessoa segura é aquela que está satisfeita consigo mesma, que confia em si e no seu futuro, pois está livre de medos desnecessários. Sendo assim, ela é capaz de tomar decisões que coincidem com as suas necessidades reais e de produzir o que seu potencial permite. Ela é, além disso, uma pessoa estável e coerente em suas atitudes. Pelo menos é consciente da necessidade de se buscar esse objetivo.

Estou me referindo a uma pessoa adulta. Mas, para se chegar a isso, é preciso que o indivíduo tenha, desde a infância, um ambiente que lhe proporcione subsídios para se tornar alguém com aquelas características. O pai, nesse ponto, vai contribuir com uma grande parcela. Através do relacionamento que se estabelece entre ele e os demais membros da família, o ambiente pode ser propício ou desfavorável ao desenvolvimento psicológico de uma criança. Existem muitas maneiras de um pai comunicar aos filhos aquele sentimento de segurança pessoal. Vejamos alguns exemplos:

  • Mostrar-se disponível, de tal forma que o filho possa recorrer a ele como se recorresse a um amigo muito especial (para conversar e trocar ideias, para pedir uma ajuda ou simplesmente para fazerem um passeio juntos).
  • Manter uma atitude serena nos momentos difíceis da vida de uma criança, para que ela veja no pai alguém capaz de ajudá-la a enfrentar seus problemas e de orientá-la quando se fizer necessário (por exemplo, quando a criança se machuca, quando adoece, quando tem dificuldades na escola, ou até mesmo quando ela tem medo de perigos imaginários).
  • Dar apoio material e, ao mesmo tempo, mostrar que essa é uma tarefa que cabe ao pai (e/ou à mãe), não por obrigação, mas porque eles (pai e mãe) se sentem felizes em proporcionar conforto aos filhos.
  • Ser um modelo, sem significar um espelho para a criança. Em outras palavras, o pai pode servir-se de suas experiências pessoais para dar ao filho uma ideia daquilo que irá beneficiá-lo no futuro. Assim, uma criança pode aproveitar o exemplo do pai em muitas situações, sem perder a sua individualidade. Ela utiliza seus ensinamentos, sem tornar-se uma simples cópia do pai.
  • Acompanhar o crescimento do filho, sobretudo na adolescência, orientando-o nas diferentes questões que costumam gerar conflitos (sexualidade, escolha da profissão, relações interpessoais, questionamentos diversos). Muitas vezes, através de uma conversa em que o filho se sente compreendido pelo pai, nasce (ou se reforça) uma aproximação que muito pode contribuir para o futuro desse jovem.

Concluindo, quero dizer que todo pai, de qualquer classe social, tem em suas mãos a oportunidade de desenvolver ou de diminuir, no filho, um sentimento de segurança psicológica. Este é apenas um aspecto de seu valioso papel dentro da família, a que me referi no início.

 

 

 

 

 

Falando de Psicologia – (44) – Quando a criança tem tudo, mas não é feliz.

Quando a criança tem tudo, mas não é feliz…

 

Hoje em dia é comum encontrarmos crianças com uma “agenda” cheia de compromissos. Há casos em que falta até mesmo tempo para a criança brincar, ou simplesmente para ficar em casa, descansando. É verdade que se deve investir na formação global de cada filho. Porém, suas necessidades emocionais não podem ser negligenciadas. Assim, torna-se indispensável acompanhar o dia a dia da criança, ouvindo-a com atenção e tentando avaliar se ela está feliz, ou não.

Tenho observado que entre as crianças na faixa etária que vai dos sete aos doze anos, muitas se sentem solitárias, insatisfeitas e até mesmo infelizes, embora recebam muito dos pais, pelo menos no que diz respeito aos aspectos materiais. Para elucidar esse ponto de vista, vou relatar um episódio que acompanhei de perto, há poucos dias.

Um menino de quase oito anos surpreendeu o pai, na saída da escola, mantendo com ele o seguinte diálogo:

“Que bom, pai, que essa semana você vem me buscar no colégio e ainda vai poder ficar muito tempo comigo, quando a gente chegar em casa”.

“Você está com saudade do papai?”.

“Não é só isso. É que eu quase não conheço você… Eu não sei qual é a sua cor favorita, não sei qual alimento você prefere, se você tem medo de alguma coisa… A gente não fala dessas coisas, não é, pai?”

“Eu acho que você está repetindo alguma coisa da televisão, pois eu te dou tudo que você quer. De onde você tirou essas ideias?”

“Da minha cabeça, pai. Você podia conversar mais comigo…”

Bem, o pai conversou muito com o menino e os dois realmente precisavam se conhecer melhor.

Percebo que muitos pais são pessoas maravilhosas e até se dispõem a mudar de atitude, quando orientados. O que ocorre, em muitos casos, é que certas crianças com idade entre sete e doze anos são independentes em muitos pontos (na higiene pessoal, na hora de fazer o dever de casa, nas brincadeiras etc.). Fica parecendo que elas podem “se virar” sozinhas e que nada lhes falta. Principalmente quando todos (pais e filhos) passam o dia envolvidos com muitas atividades, sem tempo para trocar confidências, expressar afeto, estreitar os seus laços familiares…

É fácil concluirmos que novamente o bom senso não pode faltar. Ao lado de uma boa bagagem cultural, nada melhor que uma sólida bagagem afetiva. Nossos filhos merecem que a “agenda” de cada um (pai, mãe ou filho) seja estruturada de forma harmoniosa e equilibrada. Certamente os frutos serão colhidos por todos, mais cedo ou mais tarde.

 

 

 

Falando de Psicologia – (43) – As barreiras internas de certos pais.

As barreiras internas de certos pais

 

Incentivar a criança, estimular sua iniciativa, ajudá-la a substituir comportamentos inadequados por outros, mais aceitáveis – tudo isso costuma ser muito recomendado por psicólogos e outros profissionais que lidam com crianças. Como é o caso do pediatra ou da professora.

No entanto, há muitos pais que, mesmo seguindo as orientações recebidas, nem sempre conseguem obter bons resultados.

Seria oportuno indagar então: por que às vezes é tão difícil, embora seguindo as instruções dadas, mudar um comportamento do filho? Em outras ocasiões a pergunta é um pouco diferente: por que às vezes fica tão difícil colocar em prática o que em teoria nos parece tão simples?

Ora, dificuldades dessa natureza costumam existir em função da maneira como os pais se colocam  frente à conduta do filho. E, para que se obtenham bons resultados ao tentar qualquer tipo de mudança (nas próprias atitudes e no comportamento do filho) alguns requisitos são necessários. Assim, os pais precisam:

  • Ter em mente qual o objetivo a que se propuseram, ao tomar certas atitudes em relação à criança.
  • Estar atentos aos próprios sentimentos e aos sentimentos da criança, no momento em que se relacionam com ela. Sobretudo se o objetivo for a mudança de um comportamento do filho.
  • Acreditar nas medidas que pretendem executar.
  • Estar seguros no desempenho de seu papel.
  • Acreditar na capacidade do filho em mudar.
  • Aceitar as mudanças que porventura ocorram.
  • Zelar pela manutenção das mudanças obtidas.

Para esclarecer melhor, vejamos dois exemplos.

       Quando a criança é inapetente.

Alguém disse à mãe que, para acabar com a “falta de apetite”, o melhor é mostrar despreocupação pelo fato e deixar a criança procurar alimento quando tiver vontade. Mas a medida não deu resultado. Por que será?

A mãe pode por em prática sugestões como esta, mas só isso não é suficiente para eliminar uma conduta indesejável. Não basta simular uma atitude de aceitação pela inapetência do filho, se no fundo ela  experimenta sentimentos bem incômodos em relação a isso. A mãe pode ter, por exemplo, um medo muito grande de ver o filho desnutrido. Ora, se ele não come direito, por mais que ela tente disfarçar sua preocupação, alguma atitude sua acabará mostrando ao filho o que se passa com ela. E a criança, com certeza, sentirá que, de uma forma ou de outra, continua sendo alvo das atenções da mãe. E qual é a criança que não deseja isso?

Quanto à atuação do filho na escola.

A mãe leu (ou ouviu) em algum lugar que não se deve ajudar a criança nos exercícios escolares. Mas, no fundo, ela não acredita que o filho possa se sair bem sozinho. Daí, deixa de auxiliá-lo, mas não consegue esconder sua preocupação – olha a mochila na ausência do filho, faz perguntas ansiosas sobre o que ocorreu na escola, e assim por diante.

Muitos outros exemplos poderiam ser lembrados aqui. No entanto, estaríamos repisando o mesmo ponto: não basta saber o que é melhor para um filho, se os pais não reúnem, dentro de si, certos requisitos como aqueles já citados. Em outras palavras, o conhecimento puramente intelectual de um fato não é suficiente para operar mudanças nas atitudes dos pais ou no comportamento dos filhos. É preciso, antes de qualquer coisa, que se eliminem as barreiras que possam existir dentro de cada um, para que os pais consigam ter uma atuação mais satisfatória junto aos filhos.

 

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Falando de Psicologia – (42) – A criança e a fé.

A criança e a fé

     A Bíblia nos ensina, em Hebreus, capítulo 11, versículos 1 e 3: “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê. Pela fé reconhecemos que o mundo foi formado pela palavra de Deus e que as coisas visíveis se originaram do invisível”.

E o que dizer da fé infantil?

Em seu livro “Fé e vida crescem juntas”, Íris M. Boff Serbena nos mostra como evolui a fé da criança. Também outros autores, como James W. Fowler (“Estágios da fé”) e Sofia Cavalletti (“O potencial religioso da criança”) nos fornecem subsídios valiosos para compreendermos o desenvolvimento da criança na sua maneira de se relacionar com Deus.

Vejamos os conceitos de fé do ponto de vista psicológico.

Até os seis anos, Deus é percebido pela criança mais pelo afeto do que pelo intelecto, através das experiências de amor, confiança e aceitação. A confiança que os filhos depositam nos pais projeta-se para Deus, nascendo daí a linguagem da fé. Ou seja, a imagem de Deus vai sendo construída, aos poucos, pelos elementos fornecidos pelos adultos.

Muito antes de a criança ser capaz de discernir claramente os valores e crenças dos pais, ela sente a coerência entre o que eles ensinam e o que eles fazem. Daí a importância da confiança que se desperta e se mantém, desde cedo. Assim, a criança pequena atribui, aos pais, um poder que ultrapassa seus limites humanos. Cabe a eles a tarefa de auxiliar cada filho na transposição da fé humana para a fé divina. Isso ocorre, sobretudo, por meio do exemplo e da vivência religiosa. Ou seja, se os pais e outros adultos de seu relacionamento confiam em Deus, a criança passa a confiar nele.

Durante muito tempo a criança vivencia uma fé antropomórfica, imaginando Deus em forma de pessoa. Evidentemente, a maneira como ela percebe seus pais vai influenciar, e muito, a imagem que poderá ter, de Deus. Além disso, muitos estímulos devem ser oferecidos para que a fé se desenvolva a partir das necessidades infantis. Por exemplo, quando uma criança, antes de dormir, pede a seus pais que lhe contem uma história, o que ela quer, na verdade, é tê-los ao seu lado, naquele momento, para poder adormecer tranqüila e segura. O mesmo se pode dizer da oração e dos ensinamentos bíblicos. Dependendo de certas atitudes dos pais, a fé da criança ficará reforçada, ou não, em função do grau de proximidade criado, seja em qualquer hora do dia ou da noite, gerando sentimentos que certamente ficarão gravados por muito tempo…

No que se refere aos textos bíblicos, os adultos podem escolher narrativas que inspirem muita confiança e que apresentem a imagem de um Deus que está próximo, que é amigo, que ama, acolhe e perdoa. O sofrimento e o mal podem e até devem ser abordados, mas de modo a auxiliar a criança a trabalhar seus próprios conflitos, medos e tensões. O importante é que se tenha um cuidado teológico e psicopedagógico, levando em consideração a mensagem que se quer transmitir, dentro da perspectiva da criança (ou seja, respeitando-se a faixa etária, a maturidade e o contexto vivido por ela).

Podemos concluir que os primeiros e principais responsáveis pela fé das crianças são seus pais.

Em síntese, como as famílias podem transmitir a fé a seus filhos?

  1. Pelo testemunho da fé (pelo amor e respeito entre os pais e em relação às outras pessoas).
  2. Pela Palavra: “A Palavra de Deus adquire sentido concreto quando se torna realidade na pessoa humana” (São João Paulo II).

A Bíblia é indispensável na catequese em família.

  1. Pela espiritualidade (cultivando os desejos da oração, da escuta e da Palavra, da liturgia, da fraternidade).

Gostaria de finalizar esse artigo lembrando outra citação bíblica: “Ensina à criança o caminho que ela deve seguir; mesmo quando envelhecer, dele não se há de afastar” (Pr 22,6).

 

 

 

 

 

 

Falando de Psicologia – (41) – Castigos – sim ou não?

Castigos – sim ou não?

Muitos pais perguntam sobre a questão dos limites na educação dos filhos. Alguns se referem especificamente aos castigos físicos, já que nem sempre suas recomendações surtem o efeito desejado. Quero deixar bem claro que não sou a favor de castigos físicos, mas é bom ser realista e admitir que isso ocorre com relativa frequência, em nosso meio.

Vejamos alguns dos sentimentos que uma criança pode experimentar, quando apanha dos pais.

A criança se sente insegura. Se os pais se mostram instáveis, ela não sabe o que esperar deles. Principalmente se a mesma falta é punida num dia e ignorada em outro.

A criança se sente culpada. Ao perceber a tristeza dos pais, a criança sente que a culpa é sua, mesmo depois de ter sido castigada. Tal sentimento prejudica mais a criança do que o próprio castigo, em si. Ela não se sente livre, pois se considera responsável pelo aborrecimento de seus pais.

     A criança se mostra confusa. Quando os pais agradam de algum modo o filho, depois de puni-lo, é difícil, para este, saber exatamente o que eles sentem. Uma criança não consegue avaliar o tipo de sentimento que os pais lhe dedicam, pois não sabe se os pais reprovam sua conduta (quando é castigada por eles) ou se os pais a aprovam (quando recebe presentes ou carinhos depois que apanha). Às vezes, a criança mostra-se perturbada em outras situações. Por exemplo: num momento de alegria a criança pode ficar excitada e aparentar nervosismo. Ela não consegue controlar suas emoções, pois seu espelho é representado pelos pais, que também são confusos quando exprimem seus sentimentos.

A criança se sente desvalorizada. Quando os pais se mostram indiferentes e batem (com frequência e por qualquer motivo), a criança fica com a autoestima comprometida. Ela apanha sempre, sem receber qualquer tentativa de orientação, sem ter momentos de carinho por parte dos pais. Enfim, ela só é lembrada quando merece castigo. A criança se sente, então, cada vez mais insignificante.

     A criança se sente revoltada. Pode ocorrer que a criança se sinta tão rejeitada pelos pais, que acabe se tornando revoltada por sofrer muito com os castigos constantes e injustos. Ela pode até reconhecer que errou, mas não aceita os castigos que lhe são aplicados. E, como não pode revidar, a criança acumula dentro de si um sentimento de rancor bastante prejudicial ao seu desenvolvimento emocional.

Diante de tudo isso, fica fácil concluir que os castigos físicos podem ser tão nocivos, que vale a pena tentar outros métodos para corrigir os filhos. Assim, com carinho, respeito mútuo, diálogo, disciplina firme e coerente, podemos obter resultados bem mais satisfatórios, ajudando a criança a sentir que errou, mas nem por isso precisa experimentar culpa ou medo de atingir os pais de forma irreversível. Ela percebe justiça na maneira de ser tratada pelos pais e isso torna mais fácil o reconhecimento de seu erro, propiciando uma mudança positiva em seu comportamento.

Falando de Psicologia – (40) – A criança e a birra.

 

 

A criança e a birra

 

Todos nós já vimos crianças fazendo birra. Sendo assim, muitas dicas poderiam surgir, pois ficamos logo com vontade de ajudar a acabar com o choro (seja por compaixão com o sofrimento da criança, seja para restaurar o silêncio em torno de nós).

Vejamos alguns aspectos do comportamento das crianças que fazem birra.

Idade da criança. O choro irritado, muitas vezes com gritos e movimentos característicos (a criança esperneia, agita os braços e, quando já é maiorzinha, costuma jogar-se no chão) é algo que pode começar antes mesmo dela fazer um ano. Geralmente a birra desaparece por volta dos cinco ou seis anos.

Circunstâncias do momento da birra: cansaço, baixa resistência às frustrações, indisposição física, fome, sono, ciúme de um irmãozinho etc. Tais fatores contribuem para desencadear um episódio de birra, sobretudo se os pais adotam atitudes de extrema permissividade (ausência de limites) ou de extrema rigidez (dizem “não” com muita frequência e sem uma orientação que justifique suas proibições).

Características pessoais da criança: manipuladora, agressiva, rebelde ou oposicionista. Desde a fase de bebê uma criança pode aprender a manipular os adultos através do choro (seja para ganhar um colo, seja para receber um alimento). Dependendo do comportamento dos pais, o choro pode ser o mecanismo usado para alcançar satisfações diversas. Principalmente fora de casa, muitos pais acabam cedendo e o círculo vicioso se instala, tornando tudo mais difícil.

A birra é um comportamento que costuma aparecer em função de situações que ocorrem na atualidade: consumismo, o que leva as pessoas a experimentarem um forte desejo de comprar algo (e a criança aprende isso desde bem pequena); ausência dos pais (seja por uma grande demanda no trabalho, seja por se tratar de casos de pais separados) ou por outros motivos, mais sérios, que seriam indicativos de algum distúrbio emocional.

De uma forma objetiva, algumas sugestões são oportunas e valem como orientação:

  • Não ceda somente para acabar com o incômodo do episódio de birra. Se a criança não corre o risco de se machucar, deixe que ela acabe com o choro por ela mesma. Vai chegar um momento em que ela se cansa e para de chorar.
  • Não negocie com a criança, prometendo coisas para que ela pare de chorar.
  • Não tente conversar com a criança na hora da birra. Ela não vai conseguir ouvir, nem compreender seus argumentos. Deixe essa conversa para um momento de tranquilidade.
  • Em se tratando de criança que já tenha um bom nível de compreensão, mostre para ela que há outras maneiras de conseguir o que deseja. E que através da birra o que ela consegue é irritar os pais e afastá-los dela.
  • É desejável que pai e mãe estejam de acordo com os limites a serem estabelecidos. Isso dá mais segurança ao filho e o ajuda a obedecer mais prontamente.
  • Sempre explique à criança que é a birra que incomoda aos pais, e não a pessoa do filho. É indispensável que a criança se sinta amada e valorizada, pois do contrário a birra servirá, também, para expressar carência afetiva.

Falando de Psicologia – (39) – A fantasia, dos quatro aos dez anos.

A fantasia, dos quatro aos cinco anos

   Esse é um período muito marcante, no que se refere à fantasia da criança. Podemos dizer que, nessa época sua imaginação se torna tão fértil a ponto de influenciar bastante, o seu sono, enchendo-o de pesadelos e sonhos absurdos. Seu relato das ocorrências mais banais é tão rico em detalhes, que muitas vezes a criança passa por mentirosa. É que sua percepção dos fatos ainda está fortemente influenciada por suas fantasias e ela não consegue fazer distinção entre o real e o imaginário.

No período de transição – que vai dos cinco aos seis anos – a criança começa a se dar conta dessa diferença e, então, torna-se mais coerente naquilo que faz ou fala.

Aos seis, sete anos

   O pensamento da criança, agora, já começa a ser mais lógico. Principalmente quando seu desenvolvimento (sobretudo emocional) se processou normalmente.

Por volta dos seis ou sete anos, a realidade vai ocupando, aos poucos, o lugar da fantasia. E, com o ingresso da criança no ensino fundamental, esse processo vai se tornando cada vez mais nítido.

Dos oito aos dez anos

   A fantasia da criança, nessa idade, tem bases diferentes daquela encontrada nas fases anteriores. Seu pensamento torna-se cada vez mais racional e crítico. Com isso, ela se interessa pelos fenômenos da vida (origens, finalidades etc.) de uma forma que se aproxima da realidade que nós, adultos, conhecemos. E é por isso que, aos dez anos, uma criança, cuja evolução transcorreu sem maiores dificuldades, está apta a adquirir valores pessoais através de conceitos realistas e mais objetivos, da vida como um todo.

A fantasia que ainda persiste nessa época, aparece sob forma de antecipação do futuro. Ou seja, a criança sonha com sua vida adulta e com as vantagens de ter esse ou aquele status. Por exemplo: ser um engenheiro ou um médico, ser um ótimo mecânico como o pai, ser um famoso jogador de futebol, e assim por diante.

 

 

Falando de Psicologia – (38) – A fantasia, dos dois aos quatro anos.

A fantasia, dos dois aos quatro anos

 A partir dos dois anos, tem início uma outra forma de manifestação de fantasia. Trata-se da representação de situações mais complexas, ainda na vida diária da criança. Agora não só imita o que vê, como também se diverte representando cenas em que, quase sempre, ela é o personagem principal. Em sua imaginação, um simples carro de brinquedo pode se transformar em locomotiva, em carro de corrida ou numa nave espacial.

À medida que vai crescendo – ou seja, dos dois aos quatro anos – suas brincadeiras se tornam mais elaboradas e enriquecidas com detalhes que ela assimila da vida real (através de revistas, livros, televisão). E a criança se diverte com suas representações, pois já começa a perceber a realidade objetiva, num “mundo de faz de conta”.

Essa mudança ocorre sempre na transição dos dois até os quatro anos?

Não, nem sempre. Algumas crianças são mais criativas, em relação às outras. E é essa “vivacidade” que leva a um desenvolvimento maior da imaginação, fazendo com que muitas crianças ingressem num mundo de fantasia antes mesmo dos dois anos.

Nesse período, também tem início a fantasia, como um meio da criança expressar suas vivências emocionais. Antes disso, a fantasia é destituída de conotações dessa natureza.

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No próximo artigo vou abordar o tema: a fantasia, dos quatro aos cinco anos.