O pai (ou a mãe) pode criar os filhos sozinho(a)?
Sempre que se fala em criança que só convive com um dos pais (seja por morte de um deles, por separação ou por qualquer outro motivo) vem logo a imagem de alguém que sofre muito e que, invariavelmente, terá problemas por causa disso. É verdade que nem sempre se pode contradizer tal afirmativa já que, para muitas pessoas a morte ou a ausência do cônjuge toma proporções exageradas, muito além da dor inerente a tais circunstâncias. A morte do marido pode deixar certas mulheres numa situação muito difícil perante os filhos, principalmente quando elas são pessoas de pouca iniciativa. Incapazes de tomar decisões por conta própria, a ausência do marido as deixa transtornadas. O resultado costuma ser uma perda de controle na orientação dos filhos e, a partir daí, muitos problemas poderão surgir. O mesmo raciocínio se aplica a certos homens, quando precisam encarar uma perda.
Mas essa não é uma regra geral. Uma criança pode desenvolver-se bem, apesar da falta de um dos pais. Vejamos o que dizem alguns autores: “É perfeitamente possível para o pai (ou para a mãe), criar os filhos sem a ajuda do outro (esposa ou marido), desde que tenha uma saúde mental razoavelmente boa e não sinta pena de si próprio ou dos filhos”. Em outras palavras, uma criança tem grande chance de se desenvolver bem, do ponto de vista psicológico, quando são favoráveis as condições emocionais de quem cuida dela, bem como as circunstâncias do ambiente onde vive (sobretudo no que se refere à escola).
Outros autores assim se expressam: “A maioria dos pais tem insuspeitas reservas de força e compreensão quando se defronta com crises verdadeiras”. Acreditam, portanto, no valor que os pais encontram dentro de si mesmos, inclusive nas situações mais dramáticas. Esses autores vão mais longe, ao realizar uma pesquisa com jovens cujos pais tiveram problemas dessa natureza (por separação ou por morte de um deles). Chegaram à conclusão de que, comparativamente, a incidência de problemas de ajustamento é a mesma, tanto para jovens que vivem com ambos os pais, quanto para aqueles cujo pai (ou mãe) não contou com a presença do outro para ajudá-lo na educação dos filhos.
Tais informações devem trazer um certo alívio para as pessoas que se preocupam pelo fato de terem se separado, e o que isso representa para o futuro de seus filhos.
Vou tecer outros comentários sobre isso, em função da grande incidência de casais que se divorciam. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada ano duzentas mil crianças vêem seus pais se separarem (isso foi medido nas regiões metropolitanas do Brasil). Nas salas de aula, a paridade de crianças de lares unidos e separados é bem dividida, o que faz com que as crianças não se sintam excluídas ou diferentes umas das outras. Dessa forma, tem diminuído o estigma de que filhos de pais separados sofrem mais, têm menor rendimento escolar, mais problemas emocionais e auto-estima mais baixa que os filhos de casais que permanecem juntos. No entanto, todo cuidado é pouco, quando se trata de preservar os filhos dos prováveis danos de uma separação.
Algumas medidas, de ordem prática, merecem ser lembradas. Por exemplo:
- Os pais não devem falar mal do outro, para o filho.
- Jamais usar os filhos como “espiões”, para saber da vida do outro.
- Evitar discussões na frente das crianças.
- Reservar tempo para dialogar com os filhos, ouvindo atentamente o que eles têm a dizer.
- Conservar o bom senso, sobretudo na hora de colocar limites.
- Deixar bem claro, principalmente para as crianças, que o término do casamento não implica em perda do amor que os pais nutrem pelos filhos. Mais do que nunca é preciso tranquilizá-los quanto à manutenção desse vínculo afetivo.
O ideal é que pai e mãe possam assegurar aos filhos a qualidade e a intensidade de seu afeto, o respeito ao antigo parceiro e, principalmente, a consciência de que a relação que foi finalizada pode servir de impulso para a construção de outras, mais positivas e mais salutares.
Excelentes reflexões postas de forma clara e objetiva. Uma das coisas que acho que mais belas e interessantes nos seres humanos é a nossa capacidade de nos reinventar e ressignificar nossas circunstâncias. Como diz Ortega y Gasset “Eu sou eu e minha circunstância. Se não a salvo, não me salvo a mim”. John Powell por sua vez afirma que “o comportamento humano é imprevisível simplesmente por que é livre”. Sartre diz que “não importa o que fizeram de mim. Importa é o que faço do que fizeram de mim. Costurando essas afirmações, o que pretendo ressaltar é que se compreendermos a liberdade humana como a autonomia para darmos às experiências vividas um sentido, então não estamos condenados a nada, a não ser à necessidade de escolhermos o significado que daremos a essas experiências. Assim, não há criança, cônjuge ou família condenada ao sofrimento. O primeiro passo para a lida com as circunstâncias, é criar, como você abordou, o ambiente mais favorável ao crescimento e ao amadurecimento. Isso envolve empatia, aceitação incondicional e autenticidade.
Adorei o seu texto, Heloísa. Me instigou uma reflexão deliciosa. Lerei todos os outros.
Muito obrigada, Iolanda! Seja bem vinda ao meu blog, com seus excelentes comentários! Beijos!